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Programa Pé-de-Meia cria poupança estudantil e ajuda a reduzir evasão no ensino médio

Mais de 4 milhões de jovens já são beneficiados pelo incentivo financeiro-educacional, considerado uma das maiores inovações em políticas públicas da América Latina

 

Com 16,7% dos jovens de 15 a 17 anos fora da escola em 2022, a evasão escolar se configura como um dos maiores desafios da educação brasileira. As estatísticas mostram que a saída dos estudantes é mais comum no primeiro ano do ensino médio (5,2%) e atinge de forma desproporcional jovens negros, pobres e moradores das regiões Norte e Nordeste.

Foi para enfrentar esse cenário que o governo federal criou o que é hoje uma referência em políticas de permanência escolar: o Programa Pé-de-Meia, um dos finalistas na categoria Educação do Prêmio Espírito Público 2025, organizado pela República.org.

Voltado a estudantes matriculados no ensino médio público e inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico), o programa funciona como uma poupança estudantil. A ideia é simples: criar condições para que o aluno permaneça na escola e conclua essa etapa, reduzindo desigualdades e ampliando as chances de mobilidade social.

“É uma política educacional que protege trajetórias. Estamos falando de jovens que tinham 80% mais chances de abandonar a escola por causa da renda. O Pé-de-Meia vem para bloquear essa perda, oferecendo um apoio concreto”, afirma Marisa Costa, diretora de Incentivo a Estudantes da Educação Básica do Ministério da Educação (MEC).

 

Tecnologia e gestão a favor da permanência escolar

Inspirado em programas de transferência condicionada de países como México e Colômbia, o Pé-de-Meia vincula os pagamentos a dados educacionais atualizados em tempo real. Por meio do sistema Gestão Presente, desenvolvido pelo MEC, é possível acompanhar mensalmente matrícula, frequência, aprovação e conclusão dos estudantes.

“Essa digitalização nos permite corrigir dados, fazer ajustes estratégicos e responder rapidamente a riscos de evasão. É um ganho enorme de governança para as redes de ensino”, explica Marisa.

As histórias confirmam o efeito transformador da política. Marisa relata casos de alunos que usam o recurso para pagar internet e fazer cursinhos preparatórios para o Enem, comprar material escolar ou simplesmente garantir necessidades básicas. “Havia estudantes que faltavam porque não tinham uma calça para ir à escola ou um guarda-chuva para enfrentar a chuva. O dinheiro ajuda a cobrir essas necessidades do dia a dia e faz diferença para que eles permaneçam estudando.”

Em alguns estados, os efeitos já começam a ser visíveis. A Secretaria de Educação da Bahia, por exemplo, registrou aumento expressivo nas inscrições no Enem após o início dos pagamentos. “O incentivo mobilizou os concluintes do ensino médio a participarem do exame, o que é fundamental para ampliar suas perspectivas de futuro”, relata Marisa.

 

Mais oportunidades, menos desigualdade

Além da dimensão financeira, a diretora reforça o caráter pedagógico do programa. “O Pé-de-Meia é educacional, porque fortalece a escola e o protagonismo dos jovens. Essa juventude deixa de abandonar os estudos por motivos básicos de sobrevivência e passa a ter condições de construir um projeto de vida. Isso é revolucionário”, avalia.

Ela cita como exemplo a estudante Joyce Oliveira, da periferia do Distrito Federal, que conseguiu ingressar em Medicina na Universidade de Brasília. Parte do recurso do Pé-de-Meia foi usado para pagar internet e comprar equipamentos de estudo. “É uma juventude que agora pode sonhar alto”, resume Marisa.

Como outras políticas sociais, o programa enfrenta críticas de setores contrários à transferência de renda. “Ouvimos muito que não se deve ‘dar dinheiro para os pobres’, mas mostramos que se trata de uma política educacional, com objetivos claros: garantir acesso, permanência e conclusão escolar”, afirma a diretora do MEC.

No modelo atual, o jovem matriculado no ensino regular recebe R$ 200 mensais, disponíveis para saque a qualquer momento. Além disso, a cada ano concluído, é feito um depósito de R$ 1 mil em uma poupança de acesso restrito, que só pode ser resgatada após a formatura. Há ainda um adicional de R$ 200 pela participação no Enem.

Em 2024, o Pé-de-Meia passou a atender também alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) com renda familiar per capita de até meio salário-mínimo, ampliando o público atendido de forma significativa. No caso dos estudantes da EJA, os incentivos variam entre R$ 200 (quando há matrícula) e R$ 225 (para incentivo à frequência). O valor somado pode chegar a R$ 9,2 mil por estudante ao longo do ensino médio.

Hoje, cerca de 4 milhões de estudantes — o equivalente a 54% das matrículas do ensino médio público — já recebem o benefício. “Estamos investindo na juventude mais vulnerabilizada do Brasil. Quanto mais tempo ela passar na escola, mais condições terá de transformar a própria vida e a do país”, diz Marisa Costa.