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“Educação é muito além da escola. Ela é a materialização do poder público na conexão com as pessoas.”
Kátia Schweickardt, Educação (2020)

Kátia Schweickardt, Educação (2020)

Conheça a vencedora destaque na categoria Educação, Kátia Schweickardt, responsável por reconfigurar todo o sistema de ensino do município de Manaus. A carioca de nascimento e manauara de coração ajudou a elevar o índice de aproveitamento dos alunos e promoveu grandes conquistas para os moradores da região Amazônica. Mas antes de alcançar tantos feitos na Educação, sua história passou pelo estudo da terra e começou no Rio de Janeiro.

Nascida no Hospital dos Servidores, Schweickardt foi criada no Méier, subúrbio do Rio. Apesar da separação dos pais quando ainda era criança, sempre teve uma forte ligação com os dois. A carioca conta que desde cedo sua trajetória foi guiada por um conselho marcante do pai. Segundo ele, não bastava que Kátia fosse boa no que fizesse — enquanto mulher negra, ela precisava estar entre as melhores. Sua família sempre acreditou que ela e o irmão iriam longe, apesar do racismo estrutural, e que isso seria alcançado pela educação. Anos mais tarde, mudou-se com a mãe e o irmão para uma região mais privilegiada da cidade, época que teve a oportunidade de estudar em uma escola particular de referência. De acordo com Schweickardt, não havia outras crianças negras no colégio. O conselho do pai tornou-se, então, um mantra.

Prestes a fazer 17 anos, passou no curso de Agronomia na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), o mesmo do seu então namorado. No fim da graduação, decidiu casar-se e mudar-se para Rondônia com o companheiro, que havia passado em um concurso público. Na época, a casa onde morava só dispunha de duas horas de energia por dia. Começava ali o mergulho de Schweickardt na realidade do interior da Amazônia.

A década de 1990 trouxe muitas conquistas para a carioca. Na vida pessoal, foi quando se mudou para Manaus, casou-se de novo e ficou grávida do primeiro filho. No âmbito profissional, iniciava sua jornada no serviço público como engenheira agrônoma do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Como o interesse pela academia manteve-se vivo, foi também nesse período que começou a segunda graduação, dessa vez no curso de Ciências Sociais da Federal do Amazonas (UFAM). Na virada do século, deu início ao mestrado em Sociedade e Cultura na Amazônia.

A essa altura, recomeços em sua trajetória não eram uma novidade. Em 2001, seu segundo filho chega ao mundo. Três anos mais tarde, é transferida para sua cidade natal. Acostumada a fazer parte de muitos projetos ao mesmo tempo, ela inicia, em 2006, o doutorado em Sociologia e Antropologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Sua tese veio a se tornar, anos depois, o livro “Faces do Estado no Amazonas: entre as curvas do Rio Juruá”.

Quando retorna a Manaus, em 2009, e finaliza o doutorado à distância no ano seguinte, seu novo desafio é a sala de aula, agora como professora da graduação. É a partir desta última década que seu caminho na educação deslancha e não demora muito para que sua trajetória interdisciplinar seja notada. Em 2013, Schweickardt é convidada a assumir a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Manaus. Durante a gestão, a agrônoma e cientista social criou espaços verdes na cidade e reorganizou os parques urbanos. O trabalho deu tão certo que dois anos depois ela é chamada para chefiar a Secretaria de Educação do município, o que significava sair da pasta com menor orçamento para assumir a maior.

A rede de Manaus é a terceira maior do Brasil, com mais de 240 mil alunos – incluindo escolas rurais e ribeirinhas – além de quatro escolas indígenas com ensino bilíngue. Um enorme desafio, mas a trajetória de Schweickardt deixa claro como isso sempre a moveu. Seu trabalho mudou o foco dos problemas do município para promover soluções inovadoras. A partir da sua gestão, não é mais a infraestrutura que orienta a agenda da pasta, mas o olhar pedagógico. Ela assume um papel de liderança e inspiração e faz um planejamento estratégico que redefine a missão da equipe. Um lema universal foi criado na Secretaria: fazer Educação Básica de qualidade, acessível e inclusiva, que garanta a permanência dos estudantes e a valorização dos profissionais da educação.

Os resultados desse processo têm sido extraordinários. A capital deu um salto no Ideb – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica e, de 2013 à 2017 foi da 20ª posição para a 9ª. Uma das ideias da Secretaria foi qualificar o debate com a sociedade, para que se compreendesse as reivindicações necessárias para além daquelas que envolvem merenda e infraestrutura. Schweickardt também coordenou ações de incentivo à leitura, reforço escolar, combate ao abandono e engajamento familiar. Criou a Avaliação de Desempenho do Estudante (ADE), realizada três vezes ao ano para acompanhar a aprendizagem do aluno e implementou a Educação Integral, que hoje atende 13 escolas. Além disso, promoveu melhorias na infraestrutura da rede, construiu novas unidades de ensino e otimizou o fluxo do transporte escolar. A sua reformulação na logística de transporte, especialmente desafiadora em Manaus, garantiu que os alunos chegassem sem atraso e com segurança à escola, seja pela estrada ou pelo rio. Com a mudança, o município passou a ter uma economia de 30% ao mês no custo com combustível.

Em 2019, foi selecionada para atuar como professora visitante na Universidade de Columbia, em Nova York. Reverteu a bolsa concedida para a formação da sua equipe, já que, segundo ela, todos os resultados conquistados passaram por muitas mãos. A pandemia impediu seu retorno a Nova York em 2020, mas trouxe o desenvolvimento de outros projetos, como os programas “Aula em casa” e “Eba! Vamos brincar”. No primeiro, os alunos dispõem de aulas na TV aberta e em uma plataforma online. O segundo, voltado para a Educação Infantil e também exibido na TV aberta de Manaus, alcançou a audiência de mais de um milhão de crianças na primeira semana que foi ao ar. Schweickardt investe e capacita pessoas porque acredita que “a educação é a política pública que chega mais perto de crianças e adolescentes socialmente vulneráveis”.

Educação é muito além da escola. Ela é a materialização do poder público na conexão com as pessoas.

Kátia Schweickardt, Educação (2020)

O que você gostaria que as pessoas soubessem sobre Manaus que elas não sabem?

Primeiro, que nós somos a terceira maior rede de educação básica do Brasil, atrás somente de São Paulo e Rio. Segundo, que nós somos a principal capital no coração da floresta. Como cidade, nos fizemos de costas para a floresta e agora viemos em uma empreitada de nos reencontrar com ela.

O fato de sermos mais próximos da selva, que é a imagem que se costuma ter da floresta, não nos torna inferiores. É aí que reside a nossa potência. O planeta não pode seguir existindo sem considerar a importância ecológica, biológica e da sociobiodiversidade. A riqueza das múltiplas etnias que aqui convivem há mais de dez mil anos e que tem muito a ensinar para esse mundo urbano, que a pandemia mostrou que tem muitos limites. É muito importante o Brasil saber que aqui fazemos educação de qualidade pra valer.

Como a sua formação em diferentes áreas do conhecimento contribuiu para o trabalho na Secretaria de Educação?

A Agronomia ainda me ajuda bastante a entender a importância do cuidado com o meio ambiente para a nossa sobrevivência. Eu continuo sendo professora do Programa de Pós-graduação e Ciências do Ambiente também para que os alunos se identifiquem comigo. Há muito preconceito entre as ciências. As ciências de matriz tecnológica e biológica tendem a ser consideradas mais ciência do que as humanas e sociais. Foi por meio dessa percepção que eu fui para as Ciências Sociais, e foi fundamental para a gestão da Educação.

O fato de eu ter estudado bastante Sociologia e Antropologia me ajudou a colocar a gestão da educação dentro desse contexto e ajudar as equipes a se verem como motores dessa transformação necessária. Ter sido uma secretária mais socióloga e antropóloga do que pedagoga fez muito sentido, porque eu entendi logo a conexão entre o que é feito fora e dentro da escola. Escolas que estão em bairros muito violentos, por exemplo, precisam de um trabalho que considere essa realidade. Não adianta só o trabalho pedagógico para dentro da escola porque aquelas crianças estão dentro de um mundo. Precisamos fomentar esse debate. É preciso que os professores entendam que eles são os mediadores na nova visão.

Aprendemos mais e melhor quanto mais exercitamos a escuta do outro e esse encontro de saberes. Paulo Freire entendia a importância de ser protagonista onde você está e que esse protagonismo depende de repertório. Então não adianta eu só formar alunos conscientes e críticos, professores politicamente críticos, se eles não têm repertório e não seguem estudando. Acho que, no fim, é uma alma inquieta que leva um pouco das duas formações.

Não adianta eu só formar alunos conscientes e críticos, professores politicamente críticos, se eles não têm repertório e não seguem estudando.

A Amazônia é uma área de muitos conflitos por território. Como foi a sua atuação no Incra, dado esse contexto?

Antes de tudo, é importante entendermos que não existe uma única Amazônia. Eu vim de Rondônia, e essas áreas onde teve grandes projetos agropecuários, altamente estimulados pelo governo federal e pelo Incra, são as áreas onde se concentram os conflitos. O Estado do Amazonas tem uma história diferente. O fato do Amazonas não ter essa conexão fácil por estrada, dificulta a implantação desses projetos. O Amazonas é uma Amazônia diferente. É um estado de população mais tradicional, de ribeirinhos e posseiros, que são mais herdeiros da política da borracha.

Nas reuniões do Incra em Brasília, eu dizia que deveríamos fazer uma política mais voltada para a regularização fundiária. Eu não precisava criar um assentamento, eu deveria reconhecer que os ribeirinhos eram os donos da terra e intitulá-los. Na minha opinião, o Amazonas não deveria ter uma política de assentamento, mas uma política de reconhecimento de posse.

A história do Incra é muito ambivalente. Como eu, ao entrar no Incra, também começo a estudar Ciências Sociais, eu também vou qualificar meu discurso. É muito importante olhar para as pessoas e aprender com elas, colocando o que você acredita, construindo com elas consensos possíveis. Acho que conseguimos dar voz para esse debate.

Em algum momento da minha vida eu abandonei a Sociologia das ausências e passei a fazer o melhor que eu posso com as presenças.

Por que você decidiu ser professora?

Acho que eu tinha uma necessidade, que me acompanha até hoje, de aprender. E, pasmem, o jeito mais eficiente da gente aprender coisas e entender porque estamos nesse mundo e o nosso papel nele é ensinando. Porque quando compartilhamos o que sabemos com o outro, aprendemos mais, porque refletimos sobre o que estamos falando e, na fala e reação do outro ao que nós estamos passando, vamos produzindo cada vez mais conhecimento.

Minha paixão por aprender, compartilhar informações e ajudar as pessoas a produzirem conhecimento, para melhorarem a sua vida e o mundo em que vivem, foi o que me tornou professora.

Qual o principal desafio de assumir o cargo de secretária no município com a terceira maior rede de ensino do Brasil?

Sem dúvidas, trazer o pedagógico para frente da pauta política e financeira foi o nosso maior desafio. Nos últimos 30 anos, todos os secretários que passaram antes de mim, foram ou serão candidatos a cargos públicos eletivos. Eu tinha aversão ao que eu considerava o submundo da política. Mas não era só o meu modo de trabalhar que era o motor da transformação, eu precisava também entender e respeitar o jeito de fazer política dessa categoria. Foi um grande desafio e aprendizado. Passei a respeitar mais e a tentar compor com eles. Aprendi a fazer política com P maiúsculo. Sempre voltada para a missão que eu tinha pactuado com a Secretaria lá no início.

Outro grande desafio é financeiro, pois você vai lidar com o maior orçamento e Secretaria do município. Existem pressões de todos os lados. Fazer o que é correto, organizar processos, fazer uma gestão mais transparente e mais compartilhada não é fácil. Hoje, prestes a sair do cargo, fico pensando como será para quem vem. Espero que vários dos nossos processos tenham sido internalizados e que sejam perpetuados por quem fica.

Como foi o processo de implementação e execução do Sistema de Gestão de Frota de Manaus? Considerando os desafios territoriais da cidade, que possui muitas comunidades rurais, ribeirinhas e indígenas mais afastadas.

A questão do transporte é muito complexa para nós. Nas nossas 496 escolas, 84 são rurais e ribeirinhas. Nós temos ônibus e lanchas, por conta das escolas na beira dos rios. Quando eu cheguei na Secretaria, parte dos contratos eram feitos por diárias. Apesar de termos o maior orçamento do município, o nosso custo com aluno é um dos mais elevados e que recebe menos investimento.

Propus, em 2017, que fizéssemos um estudo das rotas e, talvez, mudássemos a modalidade do contrato. Mudamos os indicadores e demos prioridade às escolas estratégicas. Entre os indicadores que levantamos para definir essas escolas, aparecia o fator do atraso do aluno. As crianças chegavam muito atrasadas porque o transporte chegava atrasado. Foi quando entendemos que a logística de transporte precisava ser revista. Vimos que muitas crianças que estavam com notas ruins tinham o número de horas na escola muito abaixo do aceitável. Fizemos a geografia de todas as rotas e trabalhamos para mostrar para todos os gestores a rota, o tempo gasto e o backup. Eu dizia que não queria ser insubstituível porque se eu for, significa que eu fui péssima. Daí a importância do backup, para passar a informação adiante.

Precisamos promover as condições para que o conhecimento seja produzido. Esse trabalho de transporte foi muito inovador. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) veio conhecer o nosso trabalho e nos perguntou por que tínhamos feito tudo isso. Respondemos que a motivação estava no atraso dos alunos, porque quando eu direcionei o foco para o pedagógico, eu mudei o modo de fazer gestão de todos os programas.

Quais medidas foram adotadas para a Secretaria lidar com comunidades escolares tão diversas?

A primeira coisa foi entender que a diversidade é nossa riqueza e não nossa fragilidade. Toda educação que é homogeneizante é empobrecedora, e a tendência da educação na era moderna foi homogeneizar. A intenção nem era essa, mas esse é o efeito colateral nocivo. A ideia era universalizar o acesso, que é uma ideia muito inovadora. Mas a questão é que entre universalizar o acesso e garantir o mínimo, há uma tendência à homogeneização. Ela segue padrões e são esses padrões que começam a dar problema. Essa é a grande crítica às avaliações de larga escala, onde se faz prova para comparar pessoas que não têm as mesmas condições. Tentamos aproveitar a avaliação do Ideb para ressignificar nossas práticas. Mas é preciso ter uma reflexão sobre isso.

A diversidade é nossa riqueza e não nossa fragilidade. Toda educação que é homogeneizante é empobrecedora.

Nas escolas indígenas, tínhamos que trabalhar respeitando a diversidade deles e sua organização social. Não é a comunidade que é da escola, é a escola que pertence à comunidade. Nas escolas indígenas, os professores são moradores das comunidades. O currículo precisava considerar essa distinção e eles precisavam trabalhar a partir de si e da sua língua. Existem os centros culturais indígenas, que antes pertenciam à Secretaria de Cultura. Passamos a considerar os centros como extensão do fazer educacional.

Nas escolas ribeirinhas, também temos uma outra gerência, que é a de educação do campo e da floresta. Não podíamos só fazer educação do campo, era necessário incluir a floresta. O mundo rural da Amazônia é polivalente.

Trabalhamos oficialmente com dois calendários anuais. Nosso dia letivo começa na primeira segunda-feira do ano nas áreas ribeirinhas porque é a época que os rios estão mais cheios e eles têm aulas até outubro, quando os rios começam a secar e diminui a navegabilidade.

Em fevereiro, começam as aulas nas outras escolas dos ramais e nas escolas urbanas. Eu pude ajudar a rede a ressignificar essa distinção do ano letivo. Na medida em que eu fui vivendo e fazendo sociologia da educação no meu cotidiano, eu vi que toda sala de aula é multisseriada. Nós é que temos que aprender a fazer educação de qualidade na diversidade. Começamos a abrir o ano letivo na área ribeirinha não só pelo movimento das águas, mas principalmente porque nós somos uma cidade da floresta. Temos que nos reencontrar com a floresta e aprender com esse modo de vida.

Na medida em que eu fui vivendo e fazendo sociologia da educação no meu cotidiano, eu vi que toda sala de aula é multisseriada. Nós é que temos que aprender a fazer educação de qualidade na diversidade.

Como é abordado o estudo sobre a região no currículo escolar?

A Amazônia não é uma, são várias. Nós temos a maior população indígena do Brasil que se autodenomina. Trabalhamos a legislação do estado, com história e geografia do Amazonas. É muito diferente eu saber que tem essa obrigatoriedade do fato de eu entender e ressignificar isso na minha prática.

Nós tínhamos como base conceitual do pensamento o que acontece no eixo Rio e São Paulo. As pessoas dizem que respeitam a Amazônia, mas não se dão conta que o nosso país tem fusos diferentes. O que significa que na prática o nosso referencial só é um: Rio e São Paulo. Essas coisas dizem da hierarquização do pensamento, de como você organiza o mundo e diz quem é, quem não é.

Todo o meu trabalho aqui foi de potencializar algo que já estava posto. O quanto ser da Amazônia pode e deve nos orgulhar? Não porque ela é uma coisa idílica, mas porque aqui se produz um conhecimento que só se produz aqui, tal como ele é. Quando eu olho para o mapa, eu só vejo verde. Quando eu sacudo, como um tapete, é a vida das pessoas. Eu poderia simplificar a resposta e dizer que é obrigatório e já está no currículo. Mas é muito mais do que isso. Paulo Freire já dizia, “trabalhar a informação para que o conhecimento se produza a partir da vida”. O ambiente de aprendizagem potente tem que reconhecer que nós somos múltiplos e diversos. O fato de estarmos no coração da principal floresta tropical do planeta nos faz ricos e poderosos, mas não porque ela é verde. É porque ela traz dentro dela muitos conhecimentos e saberes que precisam ser reconhecidos, validados e explorados, assim como muitos outros pelo Brasil.

Antes da pandemia, o sistema educacional da região já utilizava o sistema de aulas à distância. Qual a importância de se ter diferentes métodos de ensino e o que mudou com a pandemia?

Na nossa rede, nós já usávamos, antes da pandemia, a introdução das tecnologias computacionais, o letramento digital. Os livros têm para as pessoas da minha geração uma relação de afeto. O mundo digital é outro. Por meio do mundo digital perdemos um pouco das relações em presença, mas ganhamos uma série de outras possibilidades de relação entre ausentes. Com a pandemia não temos muita escolha, teremos que mergulhar nesse mundo e isso traz uma série de desafios para os professores, mas nos aproxima, obrigatoriamente, de crianças e adolescentes, porque é uma geração que já nasce no mundo digital.

Para mim, 2020 não é um ano perdido, mas sim de muitos aprendizados, e um deles é esse. Educação é muito além da escola. Ela é a materialização do poder público na conexão com as pessoas. A escola tem uma série de funções importantes, muitas vezes sendo o lugar onde as comunidades se reúnem.

Precisamos entender que, para além dos nossos modos clássicos de veicular informação e de promover ambientes de aprendizagem para crianças, começamos a penetrar nesse mundo em que eles já estão. Passamos a redefinir o papel do professor. Após a pandemia, sairemos, definitivamente, desse lugar de transmissor de conteúdo, para uma educação baseada na interação.

Nesse momento, estamos colocando o aluno no centro do processo. O professor deixa de ser um transmissor para ser um mediador, quase como um guia no processo de aprendizagem que o aluno vai fazendo. Você passa a promover a autonomia dos alunos. A educação baseada na interação e compartilhamento dos aprendizados. É um mundo de experimentações e construções, de sonhos coletivos e individuais, que possam ser processualmente buscados e realizados. As informações estão postas, o professor precisa ajudar o aluno a fazer o filtro desse volume de informações e saber quais são as de qualidade e o substrato para que ele produza o conhecimento que de fato vá ser impactante no seu mundo.

A família é fundamental. Não a família clássica, mas aqueles que cuidam social e afetivamente da criança. Esse sujeito, que agora se aproximou mais da educação durante a pandemia, ele não mais pode se afastar. Entendemos que a criança aprende mais e melhor quando conectamos a escola com a família. Essas famílias passam a entender a missão do professor de uma forma muito diferente.

Qual o maior aprendizado que o serviço público te proporcionou?

Compreender que cuidar da coisa pública é cuidar do bem-estar de todos os cidadãos, do funcionamento harmônico da sociedade. Gerenciar conflitos às vezes carrega a potência da transformação. Aprender com eles é lidar bem com o dinheiro público, porque é um dinheiro que envolve o sacrifício e esforço de cada um de nós. Ser servidor público, mais do que uma função, tem a ver com um estado de espírito. É aquele que se coloca a serviço. Ao se colocar a serviço ele participa ativamente da construção de uma sociedade que ele espera que se efetive.

Qual o seu maior sonho hoje?

Que tenhamos mais redes de Educação Básica transformadoras na Amazônia, especialmente aqui no estado do Amazonas. Eu acho que mostramos a partir da nossa experiência em Manaus que, muito mais do que recursos econômicos, o que precisamos é de investimento nas pessoas. Ajudar as pessoas a acreditarem mais nelas.

Jornalismo: Julia Sena